Duas e quinze
15.5.15
Abraçada ao travesseiro que sempre foi meu melhor amigo, lanço um olhar vazio para o teto desse quarto quente de paredes vazias. A mente está cheia. Todos as noites centenas de pensamentos - que não faço ideia de onde vieram - enchem-me e me impedem de dormir tranquila.
Penso em tudo que um dia já vivi ou deveria ter vivido. A casa da minha vó, acordar com o som da sua vassoura varrendo o chão. Minha irmã quebrando meus brinquedos. Minha irmã. Talvez se ela estivesse aqui esse cômodo fosse menos sombrio, mas é melhor assim. E se entrarem na minha casa de novo? Deveria trancar a porta e fechar a janela, mas não vou. Confio. Fearless. Não é isso que repito para a minha imagem anêmica refletida no espelho? Fearless.
A cena muda. Minhas avós, meus pais e minha irmã, de novo. Ela não sai. Ela carrega um pedaço da minha alma. Com o que será que estão sonhando? Seja lá com o que for, o sonho da minha mãe deve tá assustando o meu pai. O dele também o assusta. Tudo assusta o meu pai, na verdade. E se amanhã eles não estiverem aqui? E se o sono os levar devagarinho? Todos iremos um dia, mas e se for h-o-j-e? A-g-o-r-a? Lágrimas. Meu Deus, não pode. E quem sou eu pra dizer a Deus o que pode e não pode? Ninguém.
Será que um dia serei alguém? A cena muda. Faculdade. Será que estou no curso certo? Como posso pensar isso indo pro terceiro período? Só faltam sete, sete chances de fazer mais. É tempo de ser melhor, de ser ninguém pela última vez. Meu pai quer que eu seja doutora e eu quero... O que eu quero mesmo? "Nenhum vento sopra a favor de quem não sabe pra onde ir", segundo o Sêneca. Preciso ajustar as minhas velas, mas se... Deixa pra lá. Preciso de um emprego.
Pego o celular na mesinha de canto que minha mãe não deixa encostar no canto. Duas e quinze. Não são horas de pensar nessas coisas, já chega por hoje. Me viro pro lado e para me desobedecer, penso pela última vez. E apenas penso que pensar dói de mais.
6 comentários
Que lindo texto, adorei a sua escrita. As vezes quando vou dormir, fico me perguntando se faz bem (ou sentido, não sei) ficar pensando no passado e em um futuro incerto. Muitas vezes nos preocupamos demais e com as coisas, e esquecemos de curtir o momento e as oportunidades que a vida nos dá.
ResponderExcluirBeijos, Gabi
Obrigada Gabi :) Também acho que não vale tanto a pena lembrar o passado nem pensar no futuro, mas esses pensaentos são involuntários e incontroláveis :(
ExcluirPensar dói e dói muito. Onde vamos chegar pensando tanto assim se não apenas no sofrimento? Eu me pergunto isso diáriamente antes de repetir tudo de Novo na minha cabeça...
ResponderExcluirwww.eunomadiando.blogspot.com.br
É uma boa prática, espero um dia me libertar desses pensamentos bobos
ExcluirOlá Juliana,
ResponderExcluirQue texto fabuloso!
Li o primeiro parágrafo e não resisti em continuar a ler até ao fim. Você escreveu de uma maneira que se pareceu a um filme, como se de vários flashbacks se tratasse (e talvez é mesmo esse o sentido do texto).
Parabéns mais uma vez!
Um beijo,
Blog "A escrita e eu"
Nossa, Jheniffer, muito obrigada! A intenção foi mesmo essa, de parecer flashbacks, porque é assim que esses pensamentos chegam até mim :)
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